(Por André Luiz Dias)

Fui criado na Igreja Católica, em uma família toda praticante. Minha avó materna era uma boa benzedeira. Negra, forte na postura, mas corpo franzino, miúdo. Uma exímia costureira e parteira. Era daquelas mulheres que chegavam nos lugares e eles se transformavam. Falava muito – “eita que D. Alzira tinha a língua solta” – e acho que isso nela também me encantava. Mulher simples, mas tinha uma altivez que era natural. Lembro-me dela sempre pilando o corante no fundo do terreiro ou fazendo bico, olhando por cima dos óculos para colocar a linha na agulha.
O catolicismo, em mim, acho que nasce dai! Tinha por ela admiração e sua fé foi transferida. Ela me levava para novenas, procissões, me pedia ajuda nas quermesses e, assim, fui construindo essa identidade religiosa espiritual.
Os sacramentos, todos eles, eram uma festa para ela, quando realizávamos. Mas lembro-me também de, na tenra idade, falar com ela sobre vozes que eu ouvia, sobre lembranças de pessoas que eu não tinha conhecido e que me visitavam, de intuições, sensações e uma série de coisas que aconteciam e que não sabia explicar. Ela dizia que era normal, “tem gente que nasce assim meu filho”, mas dizia também que era tentação e me mandava rezar.
Escutei falar das coisas místicas muito cedo. Eu, menino do interior, católico, morador da periferia, não me atrevia, ainda, a bater de frente contra aquilo que ERA PECADO! Os rituais sempre me encantaram. Os estudos foram necessários. A ciência, uma fé lógica, com início, meio e fim, sem condenação, punição ou aquele lugar do pecado que eu não entendia e não aceitava tanto. Depois vieram os livros de André Luiz e alguns outros pela vida inteira. Vieram, de forma mais intensa, os contatos com o “além”. Os sentidos e percepções fizeram sentindo.
Fugi muito! Confesso! Não por medo, mas por ter noção do tamanho da responsabilidade. Hoje, cada vez mais, compreendo e tento ainda fugir. Algumas passagens, momentos por essa vida, doem, fisicamente e espiritualmente, e continuo escutando, vendo, sentindo, sendo instruído e, em algumas vezes, sendo instrumento de lá para cá. Às vezes, de forma sutil. Em outras, com experiências físicas, que meus amigos mais próximos costumam se assustar ou são arrebatados por algo que é divino e necessário. Sinto sempre a presença e a visita da minha vó! O toque suave nos meus ombros em um determinado momento, o cheiro dela no espaço e aquela frase de estímulo que fez sentindo. Os contatos com ela desde sua partida são corriqueiros na minha vida. Com manifestações sentidas, inclusive, por aqueles que estão nos recintos comigo!
Lembro-me do nosso elo maior, do contato dias antes da sua partida terrena, em uma conversa, após ela pedir para ir ao banheiro. Ela não queria que eu a levasse, e sim minha Tia Cleuza. Levantei do sofá, fui ao quarto e conduzi aquele corpo até o banheiro. Brinquei, dizendo que ela dava muito trabalho. Era nossa intimidade! Ela, frágil, caminhando com dificuldades, se encostou na parede, olhou nos meus olhos e disse:
-Nada mais justo, seus primeiros passos você deu comigo, nada mais justo que nos meus últimos você me ajude a caminhar.
Achei aquilo de uma beleza, mas não pesei! Saí em viagem horas depois e, no dia seguinte, recebi a ligação para voltar, pois ela tinha partido. Enfim… ela, minha vó, é hoje um desses seres de luz com os quais tenho meus contatos e que me ajudam a caminhar. E, como nessa vida a gente não veio pra ser só, caminhamos juntos, do lado de lá e de cá, tentando manter essa sintonia de amor, que nos custa renúncias e tantos outros sofrimentos silenciosos.
Mas o meu reino não é desse mundo, não mesmo. Que assim seja!