(Por Pe. Elizeu Hilário de Souza)

Na abertura da 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP26), que aconteceu de 1º a 12 deste mês em Glasgow, na Escócia, a voz de Txai Suruí, uma jovem indígena brasileira, de 24 anos, ressoou por todos os cantos do planeta ao falar da importância dos povos indígenas na proteção da Amazônia:
“Meu pai, o grande cacique Almir Suruí, me ensinou que devemos ouvir as estrelas, a lua, o vento, os animais e as árvores. Hoje, o clima está esquentando, os animais estão desaparecendo, os rios estão morrendo, nossas plantações não florescem como antes. A Terra está falando, ela nos diz que não temos mais tempo”.
O grito dos pobres, somado ao grito da terra, insiste em denunciar que a maneira como temos nos relacionado com a natureza está levando-a a uma acelerada destruição. Por todo lado e em todos os níveis o que se constata é exploração, devastação, crise hídrica, aquecimento global, gerando consequências nefastas para a vida humana e o meio ambiente. Neste cenário desolador, os pobres são os que mais sofrem com a degradação ambiental.
E nós já temos informação suficiente para entendermos que a crise ecológica é consequência de um capitalismo desenfreado que tem como princípio e finalidade apenas obter lucro; que, a serviço deste e em nome do progresso, justifica a exploração dos recursos naturais, impulsiona a industrialização e fomenta o consumo compulsivo e insaciável.
As consequências desta ganância devoradora e deste egoísmo destruidor nos advertem que o momento em que estamos vivendo é decisivo para a continuidade da vida no Planeta Terra. “A situação em que nos encontramos já não permite mais demoras. O tempo do relógio corre contra nós! Se não houver uma eficiente mobilização de todas as forças, a vida no planeta tornar-se-á impossível. O que não podemos é chegar tarde demais, por descuido nosso ou por ignorância.” 1
Conforme os relatos bíblicos, Deus criou o mundo como um jardim, um paraíso e, ao concluir a obra da criação, viu que tudo era bonito e muito bom (Gn 1,1-31). No plano divino, as criaturas
– o ser humano, os animais, a terra, as águas, o ar, as plantas – devem viver em harmonia, numa relação de interdependência, pois uma não vive sem a outra, tudo está interligado. Porém, o egoísmo humano perverteu a ordem natural da vida, causou a desarmonia entre todos os seres da criação.
Paradoxalmente, somente o ser humano é dotado de capacidade para compreender o significado da vida e a importância de defendê-la. Porque ele é, no mundo, o sinal da presença de Deus, e todos os outros seres foram entregues à sua responsabilidade. Ele pode cultivar e usufruir, mas, sobretudo, deve cuidar da criação. Como guardião da criação, o ser humano não pode tratar os outros seres, nem tão pouco os seus semelhantes, como coisas que podem ser descartadas.
Somos convocados a uma urgente e necessária “conversão ecológica”, a uma mudança no estilo de vida que implica em conter o consumismo, evitar o desperdício, reduzir o uso da água, da energia e dos combustíveis, reutilizar materiais e reciclar o lixo, combater a poluição do ar e dos rios, ajudar a preservar a natureza e as riquezas naturais. Em outras palavras, o consumo dos bens da criação deve acontecer de forma responsável. Nosso olhar precisa estar voltado para o futuro do planeta e de todas as criaturas, humana, animal e vegetal.
As conclusões da COP26 não geraram grandes expectativas no que diz respeito à redução da emissão de gases poluentes e ao controle do aquecimento global. Também porque já sabemos que o poder econômico e a avidez de lucro das empresas multinacionais se sobrepõem ao poder político, seja ele qual e onde for, assim como ignoram o clamor da terra e dos pobres por uma nova consciência ecológica, e as exigências de uma postura ética em favor da vida, em vista de um desenvolvimento sustentável.
Movidos pelos princípios éticos e pela compaixão, atentos ao “grito gemido” que vem da profundeza e da superfície da terra, somos convocados a cuidar da nossa Casa Comum, com a consciência de sermos os guardiães da obra divina e os primeiros interessados em deixar um planeta habitável para a humanidade que vai nos suceder. Afinal, com que finalidade passamos por este mundo? Para que viemos a esta vida? Que tipo de mundo nós queremos deixar para as novas gerações? Ou, que tipo de geração nós queremos deixar no mundo e para o mundo?
1 MATOS, Henrique Cristiano José de. Ecologia e Animais – ensaio a partir da indignação ética. Belo Horizonte: Lutador, 2015, p. 124
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